O excesso do Outro no Eu

Embora a investigação e as consequentes propostas de intervenção teóricas, cívicas e políticas incidam, cada vez mais, na análise do envelhecimento e nos modelos e conceitos a ele associados, a verdade é que há ainda muito a fazer no que respeita ao apoio que, impreterivelmente, tem que ser dado ao Cuidador.
 
Apoiar o cuidador exige sensibilidade para o reconhecimento do Eu, antes do OutroQuando um avião entra em turbulência, a máscara de oxigénio deverá ser colocada, primeiro, em mim, e só depois no dependente que vai ao meu lado, sob o meu cuidado. A premissa básica desta regra, conhecida por todos nós, é que eu tenho que me manter seguro, consciente e autónomo para poder ajudar quem está ao meu lado. 


Será que se tem pensado no bem-estar do cuidador? Qual o impacto que um processo de prestação de cuidados pode ter no Eu? Como reconhecer e monitorizar o processo dinâmico que oscila entre a autonomia e o comprometimento, não raras vezes excessivo, o que leva à rápida e elevada perceção de sobrecarga?

O excesso do Outro no Eu leva a uma preocupação excessiva, a uma relação de dependência emocional e não raras vezes patológica


Não obstante, importa realçar que a qualidade na prestação de cuidados depende do bem-estar do cuidador, bem como da capacidade de gerir as suas preocupações e ansiedade, mantendo a capacidade de apoiar em processos de longo prazo. 
 
Vivemos numa sociedade onde se analisam os resultados, esquecendo os processos, onde a resposta às cobranças e exigências prevalecem sobre o bem-estar, onde o Eu é apriosionado pelo Outro. Paramos para pensar nos benefícios das relações interpessoais, em vez de analisar as consequências nefastas, aumentando a toxicidade? 
 
O processo de prestação de cuidados, caracteriza-se como sendo um sistema complexo e dinâmico, com constantes variações ao longo do tempo. Cuidar de uma pessoa constitui-se como um processo intenso, que exige muito tempo, dedicação e autêntica entrega, sobrando, não raras vezes, pouco tempo para atender às suas próprias necessidades, para viver a sua própria vida. Contudo, é muito importante desenvolver processos introspectivos, reconhecendo alguns sinais de alerta: tristeza, sensação de fadiga contínua, perda de energia, dificuldade em conciliar o sono, dificuldades de concentração e episódios de perda de memória, alterações no apetite e erros na alimentação (saltar refeições, não fazer as melhores/mais saudáveis escolhas), excessiva atenção a pormenores, alterações de humor, desinteresse e tendência ao isolamento são apenas alguns dos sinais que devem colocar o cuidador atento!
 
Com reflexão, capacidade de análise e algum esforço, deverão ser consideradas pequenas alterações que, conjugadas, poderão atenuar as implicações negativas. Assim, é fundamental: 
* envolver a família, procurando e promovendo reuniões familiares, partilhando a tomada de decisão e as responsabilidades, ainda que a intervenção dos vários elementos não pareça tão profícua; 
* estabelecer e planificar a prestação de apoio na figura coletiva, procurando um cuidador informal secundário que possa substituir o cuidador primário;
* aceitar ajuda, quer da família quer de outros elementos das relações próximas, aceitando também as diferentes formas de ajuda; o cuidador pode sentir que a prestação de cuidados não é tão perfeita como expectava, mas deve reconhecer-se o esforço e envolvimento dos outros;
* estabelecer limites ao cuidado, não permitindo que a pessoa dependente seja demasiado exigente, nem definam objetivos pouco exequíveis ou demasiado rigorosos;
manter-se aberto a novos desafios/explorar novas possibilidades poderá, também, revelar-se positivo. Por vezes, há alguma resistência à mudança, evitando a saída da zona de conforto, mas jamais se poderá tirar conclusões sem a exploração de novas respostas;
* deixar de lado os sentimentos de culpa e partilhar as dúvidas com os pares, isto é, com pessoas que são, também, cuidadores informais ou que já tiveram/passaram por essa experiência;
* evitar o isolamento e sair de casa, fazendo atividades que gostam, é também imperativo; 
* organizar o tempo, praticar relaxamento e procurar ajuda. 
 
Acima de tudo: os cuidadores devem reconhecer o seu potencial, orgulharem-se do papel assumido e ser reconhecidos. 
 
A equipa de especialistas do IPNP Saúde está disponível para preparar um plano de ação, para ajudar a cuidar do Eu e, consequentemente, do Outro!
 
Raquel Azevedo Freitas 
Psicologia Clínica e Psicoterapia | IPNP Saúde 

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